quinta-feira, 10 de novembro de 2016

XXLIV.

irei. abalado. e a tremer por dentro. o sabor. pesado da tua boca. na minha boca. a puxar-me para o interior da terra. e. toda a força. que me detém. a escapar. a esse destino. que antes quis. e uma voz. calculada. a dizer. vai. para aquele lugar onde não conheces. existência. e onde julgas. saber. que as árvores se deitam no céu. e os pássaros. sabem de cor. o nome das pedras. nas planícies. 

e não olhes para trás. na obediência cravada nos olhos.  

nenhuma casa. a ti te pertence. nenhum coração. chamas teu. ou dívida. de amor ao tempo. tens. e nem dúvidas. fechadas. sem questões. 

apenas. e só. no silêncio dos bolsos. cada dia. tens. gasto à poeira da vida. 



terça-feira, 18 de outubro de 2016

.anónimo.

.tenho de ir. 

.a vida nunca deveria de ser isto. 
.o amor. 
.nunca deveria de ser isto.


segunda-feira, 17 de outubro de 2016

XXLIII.

.depois de ti. 

.ficou a terra. queimada. as árvores. negras. e o absoluto silêncio.
.as mãos a embalar. o mistério. da tua vinda.
.os livros. por ler. nas estantes. 
.o amanhecer vigiado. pela escuridão das nuvens. 
.a chuva. parada de outubro. 
.e todos os dias. uma guerra. de espaços para fechar com toda a lentidão permitida. ao passo frustrado do caminho. 
.e eu.

.sem saberes de mim.
.eu fui até ao mar. velar. as palavras. que jurei. saber dizer. 
.e tu. 
.sem saberes quem fui. em ti.
.rasgaste. as cartas que te dei. 
.e abandonaste. o coração que te deixei vazio.

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

XLII.

para. que tema o silêncio. do medo. não resta nada. senão. os meus dedos mordidos. na quietude. em que me dividi. só resta parte da tempestade. que ao mar. todos os dias. vou derramar. cada parte destruída. cada onda. vazia. cada parte de mim. só.

sou a terna espuma. dos lamentos. uma vida por acabar. do que me fiz. não há árvore que tenha procurado. a água que o meu corpo deu à terra. nem a mais pequena luz. desobrigada. de me iluminar.  os dias. antes fosse. a raiz pobre da ausência. antes fosse. a escuridão escrita num poema. que ao amor nada devo. nada tirei.

nada. já sei dar. 

domingo, 28 de agosto de 2016

XLI.

hoje. não me apetece viver. 

tenho toda a vida nas minhas mãos. de uma forma. injusta. não há tempo. para que o coração se apague. nao há. esquecimento. ou amor. para te oferecer. 

desdém. de vida. 

sábado, 20 de agosto de 2016

I. parte.

.conhece. a sensação. de conduzir um carro. pela noite. completamente só. de olhar nu. certamente. já quis escrever sobre esse sentimento. metálico. de entrar sozinho pela escuridão. de uma forma mecânica. sem corpo. excepto. a frieza calculada da chapa. negra. daquela caixa com rodas. a roer. a estrada. eu sei. o mundo nessa hora. é pequeno. tal qual. o coração que transborda. eu sei. às vezes pareço um cão. raivoso. a devorar o caminho. que se estreita na boca a salivar. nesse. tempo. não existem sombras. nem a glória. fundada na manhã. que o sol. ainda não aqueceu. só. noite. só. alma. escura. para que os demónios. que normalmente habitam. todas as camadas da derme. até à carne crua. possam respirar. na espessura triste. do nosso medo. eu sei. todos sabemos que após. desligarmos o motor. cansado. daquele monte de ferro. somos livres. porque já não temos onde chegar. nem horas para cumprir. nem ninguém. para abraçar. 

quinta-feira, 4 de agosto de 2016

XL.

estou. imóvel. quieto. estragado. talvez. nunca venha a conseguir. dizer. uma única palavra que descreva. a forma como. me. abandonaste. como morreste. e. eu. acreditei que tu. fosses. como o vento. a chuva. e a água que corre. no rio. a onda enrolada. no fim da maré. 

(não quero saber que o tempo tenha feito de mim um homem esquecido de todos os corações ainda por encher de sangue.)

estou. irremediavelmente. ligado. a tudo o que te leve à morte. ao amor. e ao fim.


terça-feira, 26 de julho de 2016

XXXIX.

quero escrever sobre como é passar. todo o tempo. da minha vida. ao teu lado. mordo os dedos. mordo a carne. segura da falange. a pele absorve a saliva. eu cresço. de dentro. para fora. de mim. até ti. e deixo. que as minhas mãos te segurem. 

somos assim. duas pedras. paradas no fundo de um rio. eu e tu. a ver o mundo a desfiar-se. tu. moves-te. és mais leve. mais bonita. menos verdadeira. para com a tua condição. estática. de pedra. e eu. mais pesado. mais lento. para não dizer. mais feio. e desonesto. para com todo o meu desejo. de mover. para junto de ti. e na passada do rio. tu vais. e eu fico. 

e à noite. quando tu e eu. permanecíamos juntos. sobre todo aquele peso de água. tu. eras. a pedra. que mais brilhava. e eu. confundia-me. com o cascalho. e nesse lugar. tudo o que te disse. não se fez. 

quero. escrever. sobre esse tempo. e não consigo. deixei secar a saliva sobre a falange. e a pele secou. 

domingo, 24 de julho de 2016

XXXVIII.

sabes que às vezes. ouço uma voz que me diz. quero morrer.

e na escuridão que tudo o que fiz. me trouxe. digo. tenho noites. por fazer. tenho dias. por viver.  




quarta-feira, 20 de julho de 2016

XXXVII.

em todas as palavras escritas. o teu nome. em todas as palavras. por dizer. todo o silêncio que cabe dentro. de uma mão. fechada. noutra mão. 

aqui. e agora. quero que saibas. que só. tu. leste. naquele segredo guardado nos meus olhos. como pretendo. partir. naquele dia. que será. o ultimo. das nossas vidas. arruinadas. por tanto. do que fui. 

tu. sabes que sou. a tempestade e o cão. malvado. que se perdeu no caminho de casa. o coração. aberto e a escutar. o tempo. a tua ultima memória. que se vendeu. rasgada. e eternamente inconsolável. a terra. e tudo o que odiaste. em vida. 



segunda-feira, 18 de julho de 2016

XXXVI.

já ninguém lê poemas de amor. não. já ninguém escreve. sobre esse vazio deixado ao tempo. não. porque. não haja amor. para escrever. mas porque o amor denso que a imortalidade. vergou. e fez morrer no coração. dos que ainda vivem à espera. já se fechou. por dentro. eu. sou. uma pedra atirada. sobre este céu. uma palavra por dizer. e tu. dizes. amo-te. e tudo. o que havia por escrever. eu. cerro as mãos. e todo o ar. que nelas reservei. para me fazer viver. se foi. à dureza da pele. ao molde. que lhe fiz. temer. tudo o que ficou por dizer. não. já ninguém lê. poemas de amor. 

sexta-feira, 15 de julho de 2016

XXXV.

todo. o amor. dentro deste mundo. não cabe. dentro. de mim. o espaço exíguo. que o meu peito. deformado. tomou. para si. deixou-me. apenas. lugar. para assentar as memórias. nem ar. respiro. nem calor. sinto. sou. um baloiço vazio. a baloiçar. no ar. naquele movimento. lento. em que todo o impulso. que o corpo. faz. se despenha. ausente. na terra. 

todo. o amor. é uma inutilidade. sem corpo. todo o corpo. é. um mero instrumento. de fuga. sem amor. e nessa conversa seca. entre o que é o amor. e o corpo. eu. 

desisto.



terça-feira, 5 de julho de 2016

XXXIV.

ao mar. imenso. sou. todo o teu coração. a bater. até que as marés se acabem. e tudo se desmanche. sobre esta cortina negra. com que fiz. a morada para te escrever. ao mar. imenso. não sou nada. nem a penumbra da tua presença. nem o chão. castigado à morte. lenta. das pedras. ao mar. imenso. e tanto. de ti. sem lugar. para onde ir. nem. tempo. nem. terra. ao mar. imenso. sem fim. que a saudade. seja. toda a água que bebas. e não te canses. do meu exíguo corpo. e da escassez. de mim.

quarta-feira, 29 de junho de 2016

.XXXIII.

se ao amor. pertence. o teu coração. atado. a tão pouco de mim. e se em tudo te sobro. e nem luz. ou vazio. te encho. ao tempo. que tu carregas e na imortalidade de cada memória. que me deixas. eu. estou só. não só por mero acaso. mas. por total incompetência da alma. e pouca destreza de mãos que. jamais. te agarraram.


terça-feira, 28 de junho de 2016

XXXII

há de noite. uma voz que diz. em segredo o teu nome. e com ela. este deus maldito. que fez. e desfez o meu coração. consegue encontrar o lugar certo. de todas as coisas. 

em tudo. eu. sou. um trapo. a ensopar a água da chuva. a escorrer vento. a apagar-te. do horizonte. e de tudo o que fiz. nada consegui fazer. sem ti. nem deus. nem. sombra do que me deste. ou foste. 

e no silêncio. marcado no compasso que o dia. toma. de si. para. com este corpo ausente. já nada se ouve. ja nada se faz. todo o caminho é feito sem se ver. na luz encardida da escuridão. no teu braço estendido até mim. até onde as minhas mãos ainda guardam. a tua memória. em cada tendão. 

em qualquer lugar. 


domingo, 26 de junho de 2016

XXXI 

venho até aqui. sempre que posso. enquanto a vida me adormece as mãos e me destina os dias. venho até aqui. para. encher o coração de memórias. de tempo. de coisas mortas. de coisas que julgava perdidas. aqui. tudo o que me enche o coração. cheira a terra molhada da chuva. pisada pela multidão de árvores. que o vento. atou. aos braços do horizonte. aqui. posso ser uma pedra no chão. ou um pássaro no ar. uma folha presa a um ramo. o movimento perplexo das mãos nos bolsos. o assobio manchado no caminho. a lâmpada gasta que ilumina a rua. o reflexo de um rosto numa janela. e em todas elas. não sou eu. não que tudo isto seja. a mais clara negação do meu ser. mas porque antes me perdi em todas elas. 

quarta-feira, 22 de junho de 2016

XXX

se noite houver. neste pedaço de chão. nesta terra de pó. tu. e eu. seremos toda a escuridão. toda a palavra cega e permanentemente. invisível. e se a todo o acaso. não se souber. de que cor sobram os teus olhos sobre tudo em que insisto. permanecer. acabaremos por ter um fim. sem anúncio. 



quarta-feira, 15 de junho de 2016

XXVII.

silêncio. estou de partida. silêncio. que se quebra. sobre este coração. esquisito. e só. as tuas palavras. ditas. silêncio. que delas. vivo. este momento. estou sobre as ruas já desertas. agarrado ao horizonte. doente e por conquistar. sou. o vento quente. vou. se puder. até, onde tudo se fechar. e se não houver. fim. vou até onde. todo o tempo. que vivo. me deixar e solenemente. acabarei por lhe ditar. a réstia de vida. e talvez um pouco da minha morte. 

és tu. que me faltas. aqui.

e eu sigo. sem ti. com o tempo contado. no sangue. que me corre. por dentro. silêncio. que o sangue. não faz qualquer som. silêncio. que nem sei. se corre. ou se parou. 

e eu. paro. também. aqui.

e depois. de tudo. de um mar agitado. e a crescer. a cada maré. carrego nos braços. o amor que já te esqueceu. e quando tudo se fecha. e a porta. daquela casa. escura. se abre até à luz. escorregar. de dentro. do coração. serás tu. abraçada. ao meu peito.

domingo, 5 de junho de 2016

XXVI.

saudade. de ti. 


tenho o mar. dentro do meu coração. tenho o coração. dentro de ti. 


e tu. partiste. e tudo o que sou. fui. ou quis ser. ficou contigo. 


saudade, de mim.





terça-feira, 24 de maio de 2016

XXV.

e não parti. estava gasto. era. eu. uma folha de papel. uma árvore a balançar. ao vento. e talvez. algumas palavras. a sair de ti. até ao fundo da escuridão. nem luz. nem gume. da faca. e tu. dizias. nunca. sem mar. eu. era apenas.um amor. terno. para guardar dentro das mãos. um motor a zumbir. e a fechar o horizonte. 

o que é estar só. rodeado. de sombras. e de paredes. e de flores. deixar. correr todo o sangue. pelos braços até à ponta. dos dedos. e fingir. agarrar. a parte. mais quente. do peito. 


quinta-feira, 12 de maio de 2016

XXIV.

nesta tua última hora. eu fui a tua sombra. fundida no chão. frio. daquela sala. 
chorei. de ti. tudo. e sobrou ainda tanto.
fui. a mão. que te bastou. sobre todo o teu rosto. e por hoje. quando a hora. se fecha. e o silencio. é a ditadura. das nossas almas. sobre a escuridão em que todos os dias se desfizeram. eu. atroz. culpado. embalo as mãos. e a parte seca e frágil. do que me chegou da tua morte. rasgo. 

sou. tanto de ti. que ainda não consigo. encher. de mim. tanta saudade. 



quarta-feira, 4 de maio de 2016

sem fim.

dei-te tudo. de mim. as palavras. e a boca. o corpo. e toda a minha solidão. para que a pudesses fechar. em qualquer lugar onde acolhes. os teus medos.

dei-te. a estranha sensação. de que viver em ti. seria. quase impossível. 

ao meu dano. completei. todos os pontos. da ferida fechada à destreza. trémula da tua mão. e foste. implacável. foste tu. como sempre.

dei-te. todas as razões para te ires. de mim. e tu. nem hesitaste. e deste-me por perdido. algures, neste mundo. desenhado a carvão. 

não precisavas de me trair. eu teria tido. a coragem. para te deixar. a escrever. a tua história. com outra pessoa. noutro lugar. 

terça-feira, 3 de maio de 2016

XXIII.

não te meças. com ninguém. nem pela mínima e infrutífera. tentativa. de agradares. não sejas. parte. desse mecanismo. do dente. largo. da roda. dentada. que roda. e roda. até ao fim. dos dias. e que apenas. se ouve. o chiar. da mandíbula da máquina. 

eu. tenho em mim. todos os outros dias. que não vou viver. 

não quero que o amor. que ensopa. o coração. de tristeza. seja. o mesmo. que deu. à roda. a capacidade. de girar. 

se morte. houver. gentil. e sossegada. eu serei o último. da fila. até esse dia. 

domingo, 17 de abril de 2016

XXII.

aqui. onde estou. já não se respira. estão todos à minha espera. mas não sei quem são. não consigo ouvi-los. a falar. e a escrever nas folhas de papel. que deixei desarrumadas. em cima secretária. com vista para a rua. 


não consigo acordar. deixo-me. ficar. a olhar o branco. do tecto. conto. as nódoas. que a minha vista turva. antecipou. antes que as sombras. tentem queimar. toda. aquela candura. sobre mim. 

vivo. assim. na doce memória. do que poderia ter sido. e nunca fui. 
sim. talvez, tenha sido essa pessoa alguma vez. nestes dias todos que a minha vida ocupou. talvez. algum dia. fui. assim. quem quis ser. digo. talvez.
mas não me convenço.

é retórica. para fazer encher os pulmões de água. sou eu. a enganar o passado. parece que já os ouço melhor. falam alto. riem. conversam. mas não se percebe o que dizem. não se deixam ver. estão ocupados por detrás daquele pano negro da noite. eu sei. que esse pano. também, se estende. entre o que penso. e o que vejo. mais mácula. ou pedaço de nada. sou eu. a tentar invadir. todo o território que não me pertence. se eu souber. quem é o dono desta terra. onde as árvores. moram. vou à sua procura. até ao fim do sol. 


mas. talvez. não tenha tempo. a verdade dos dias. escasseia. e o sangue. que corre por dentro de mim. até ao chão. que carrego. é absolutamente. insuficiente. e se houver. deus. ele saberá. o que fazer com todos os meus planos. para invadir. aquele território imenso. que é a minha solidão.


nela. se escreve. a fórmula. química. da felicidade. inútil. 


e ao fundo. enquanto. aguardo. só. já os vejo. 

vou abraçá-los. são os meus amigos. 

sexta-feira, 15 de abril de 2016

XXI.

abotoei o casaco. os dedos. em cada botão. faziam. o movimento lento até me fecharem. o peito. o vento gelado. tentava abrir uma ferida no meu rosto. no mesmo lugar. onde os teus lábios. se demoraram. e eu. não quis saber. se era dor. ou silêncio. interrompido. de saudade.  

era. tudo.

e quando. tentei escutar se ainda respirava. não ouvi nada. 
e quando. tentei sentir se as minhas mãos. ainda se abriam. e fechavam. não consegui agarrar. nada.

era. tudo.

sol. imenso. a cair doente. a tua ausência. cada vez. maior. cada vez. a ocupar menos. os dedos mordidos. os botões. que caíram. o peito. aberto. e não vi fim. à vista. 

quarta-feira, 13 de abril de 2016

XX.

céu cinzento. céu carregado. e negro. céu a desabar. céu. a encolher-se. para dentro. da terra. na nudez. daquele acto. as raízes. das árvores. ensopadas. as folhas. enroladas no chão. a terra. castanha. o cheiro. a manhã. de chuva. tu. dentro de mim. o tempo que não se apaga. o frio. dentro das minhas mãos. o tempo que não se apaga. o frio. que agrava o esforço da respiração. o mesmo. frio. que agrava o esforço do coração. o tempo. de uma vida. em esforço. até ao desgaste. de tudo. nem frio. nem vida. 

segunda-feira, 11 de abril de 2016

XIX

meu. coração. teu. 
o infinito. 

meu. coração. teu.
sem nome. já se foi. ao tempo. que não se conseguiu compor.

meu. coração. teu.
sempre. 

meu. coração. teu.
a escuridão. e a relatividade. de segurar nas mãos. toda a vida. que não se vive. e todo o caminho que. não. se. faz. e tudo. o que não se termina.

alongo o corpo. pelo horizonte. destilo. tristeza sobre cada passo. que dou. sou a memória. o abandono. o desapego. e a circunstância. que nenhum. olhar. obedece. nem mesmo. o teu amor. fez de mim. um homem, mais profundo. escrevo pela rama. como apenas. a pele das coisas. e ouço o ruído. estridente. da chuva. nem sombra sou. nem vazio. longe. e maldito.

meu. coração. teu.
inacabado.

sexta-feira, 8 de abril de 2016

XVIII

um cão a morder-me as pernas. um coração gelado. um peito que resiste. as pernas que não se movem. um cão. que não desiste. e todas as palavras que não digo. e as vozes. que ouço. não se demoram. e hoje. a noite. não acaba. e tudo tem um fim. pergunto. afirmo. e desminto. o nada. é que tem sempre um fim. digo. entre os dentes. e olho. o céu. teimoso e escuro.


as despedidas. enrolam-se na língua. e a boca. que seca. e a boca. que mente. 


desisto. o coração não aquece. e o nada. que tem sempre um fim. repito. e sento-me. em frente a ti. horizonte. e não me demoro. 



terça-feira, 5 de abril de 2016

XVII.

demorei-me mais. do que habitual. a ver o mar. a adormecer. foi naquele dia. onde tudo desapareceu. tombando-se para dentro da terra. como um barco desabitado. 

a espera. matou-me. e naquele espaço entre as coisas. que trazia no bolso. dei por mim. a vaguear pela cidade moribunda e doente. a noite encaixava perfeitamente sobre o chão. molhado de uma chuva caída em qualquer. momento. louco. e os meus pés. fundiram-se no negro. da estrada. 

reparei. que não me movia. que o cheiro do teu corpo nas minhas mãos. já não me oferecia. o tempo da vida. e que o mar. que tantas vezes me salvou. de ti. cresceu. e abalou para outro lugar qualquer. que eu já não conseguia habitar. 

é triste. que não sofra de lentidão. a fazer luto às coisas. que antes obedeceram à minha vontade de amar. e que não saiba ver. o que tantas vezes tu. viste. 

e que não saiba. dizer. o que tantas vezes. me disseste. do que se tira. e se subtrai ao fogo imenso da nossa alma. que até mesmo a nossa capacidade de amar. se extingue. consequentemente. até ao vazio e à terra. 

quinta-feira, 31 de março de 2016

XVII.


o que hoje fiz. dois pontos. 

sonhei. que deixava crescer as mãos pelo teu cabelo. acordei tarde. olhei-me ao espelho. manhã. enrolada na janela. segurei-te as mãos. não viste. passei por ti. no corredor apagado. que miséria de luz. naquele momento. lembrei-me que ainda hoje. olhei o céu. no carro. onde o meu corpo. se deslocava. e se desfez sobre o azul da madrugada. pintado no asfalto. demorei-me. a beber café. li. o jornal. apenas as letras grandes. escrevi. três palavras. e desenhei. dois olhos grandes e assustados. numa folha de papel. perdida na minha secretária. que hoje. não vos vou mostrar. segurei-te. pelos arames. quando quase te desmanchaste. mas tu. dizes. que não é preciso. eu sei. à tarde. certamente. irei sentar-me a ver o rio. e tu. sabes. 

o que hoje. não fiz. dois pontos.

olhar o relógio. aparar a barba. cheirar-te o perfume que deixas. quando por mim, passas no corredor. apagado. falar. nem me ouço a falar. nem te ouço a falar. imaginar. que chove. e que tu me agarras a mão. quando volto as costas. nunca aconteceu. para além da imagem cinematográfica. de dentro de mim. a tela a preto. e branco. a desenrolar-se. sacudir as mangas do casaco. procurar nos bolsos. bilhetes. com frases soltas. e esperar por ti. 


terça-feira, 29 de março de 2016

XVI.

mudo. transparente. a queimar estrelas durante o sossego da noite. atrasado. e nunca adiantado. o pouco. de mim. já ruiu. sou o dedo sobre a folha. de papel. a ler. o relevo. de cada palavra. que esmago. e sei. que nunca voltarei. ao lugar. onde tudo começou. 

se me quiseres. não estarei. aqui. não sou de lugar algum. nem de nada. nem de ninguém. nem de mim. sou. 

vou atrás. das folhas das árvores. quando o vento murcha. as flores. que tento não pisar. e tenho o estranho hábito. de abraçar as pessoas. quando dormem. para depois. fechar todas as janelas. e abalar. escondido.

este céu. triste. tem todas as cores. da invisibilidade. que permanece. danada. 






sexta-feira, 18 de março de 2016

XV.

estás só.


ouves as folhas das árvores a cair. chove pouco. a chuva miúda. molha parvos. os carros passam na estrada. com os pneus colados. ao alcatrão. ouve-se aquele grito mudo. do asfalto e do pneu. a rasgar-lhe a carne. as luzes. rumam. para longe. da escuridão. esfregas as mãos. frias. uma na outra. dobras-lhes os dedos. a pele pede. mais. mão. a mão recusa. todas as mãos. do mundo. não chegavam para tanta negação de ti mesmo. estás só. e não há outra forma de estares sob este telhado de estrelas. e vai-se o frio. há um estranho a passear. nos cantos. deste mundo. e não és tu. nem ele. não é ninguém. 




sexta-feira, 4 de março de 2016

XIV

eras tu. e mais ninguém. 

nem vento. nem onda a correr pelo mar. nem tempo. a escolher. os dias. ou por qualquer rasgo de solidão. sem luz. por dentro. todo o silêncio registado em todas as ruas. desertas - há no mundo. palavras por dizer - dizes. a terra que dá lugar ao rio. e o rio. que se some. por detrás do horizonte. e a ponte. a encolher-se também. e os telhados vincam. o céu. e o céu. dorme em silêncio. sem pássaros. ou aviões a queimar a candura do fim do dia. e vem a noite. e em todos os muros que escoltam. o coração. até não haver. mais moradas. não há mais nada. depois. de ti. 




quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

XIII

deitei-me. sobre a cama. ainda quente de ti. e o meu corpo. tentava apanhar as formas deixadas pelo. teu corpo. e encolhiam-se. com os pés. desassossegados. a noite. encharcada de solidão. a cair sobre a terra. e fechei-me. sobre ti. ausente.

disse. adeus à tua tristeza. e aos teus beijos demorados. e a toda a tua. ausente coragem. que odiava. dela. fiz um coração. ainda por encher de mar e de espuma e de areia nos pés e de sol a desmanchar-se sobre o horizonte e de mãos por encher com outras mãos e de desejos a morder os dedos e a lágrimas para enxugar com os lábios e a juras de amor ainda por dizer. nunca ditas. nunca cumpridas. 


segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

XII.

todos os dias. regresso. a ti. e ao teu lugar. aquele espaço que ocupas. entre a areia molhada da praia. e o mar. azul. a escurecer o sol. do fim do dia. não sei. se ainda te demoras. nesse lugar. ou se. partiste para outro. lado qualquer. e na tua ausência. resta-me. apenas um lamento de fé. até ao teu coração. para que não me deixes. partir também. para outro lugar. qualquer. entre o céu. e a terra. 

ali. permaneço. não por teimosia breve. e orgulhosa. ou por medo. e preguiça. mas por conhecer. todos os cantos daquele. lugar. onde te deitei. e te abracei. e onde os teus cabelos se enrolaram na minha boca. e onde as tuas mãos. plantaram. uma árvore. no coração. que não sei. onde colocar. se me for. embora. 

aqui. estou. se vieres. não te demores. entre as mãos. geladas que entristeço. dentro dos bolsos. aos olhos. que se demoram. sobre o horizonte. não tenho. outro lugar. 




terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

m.

voltei ao mesmo lugar. onde te tive. de dentro do coração. até ao fim. da minha boca. passei pelas mesmas sombras. que calcavam. o caminho. para dentro do chão. dei.te. a mão. em silêncio. quando fechei. os olhos. e fiz. pendente. a tua memória. só para me fazeres companhia. os teus dedos longos. as tuas unhas. perfeitamente arranjadas. as tuas botas. gastas. a marcar o meu caminho. e o teu queixo. a encolher-te os lábios. naquele gesto de candura.

naquela noite. o vento. encostou-se. sobre o telhado daquele quarto. e só abalou. quando te sobraste no sono. e eu. a ti. abraçado. escolhi. o teu nome nos meus lábios. e não o disse. por medo. de que te fosses. para onde te chamassem. deixei no teu cabelo. tudo o que respirei. e dentro de mim. só havia. o teu rosto.

sabes. que já não tento. saber. como é viver sem ti. sem te abraçar.
sabes. que não sei.

os teus beijos. ainda me marcam os lábios. o que me mordeste. não saberia contar. sem te prender. os gestos. dos teus lábios nos meus. e as tuas mãos que ainda hoje. me percorrem o pescoço. quando vou. até ti. todos os dias.

eu vou. até ti. todos os dias.

e quando te disse. que te amava. puxei.te. para cima. até ficar mais baixo que o teu rosto, a janela por detrás. deixava. a luz. encolher-se sobre ti. a flor. que te dei. ali. abraçada. ao canto. e o teu cabelo sobre os teus ombros até ao peito. e na ternura. dos teus olhos. disse. sabes. eu amo.te. e nunca mais fui. até ti. dizer-te isto. e nunca mais fui. até ti. abrir o meu coração. a todos os meus sonhos e medos. e loucuras. e desejos. e nunca mais fui até ti. para te abraçar. nos teus dias em que me querias também. eu sei. gosto de pensar. que sei. mas não sei absolutamente nada. de ti. meu amor.

e o mar. não é o mesmo. sem ti. perdeu. o azul. ficou o cinzento. ficou. como eu. em espuma.